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Recompensa em forma de alimento: será que compensa mesmo?

Carol Albuquerque CA
qua, 26/10/2022 - 10:00
A foto mostra uma criança sentada em uma cadeira branca com uma mesa a sua frente onde está repousado um prato com guloseimas

O alimento é uma fonte de conforto para o ser humano, uma recompensa que nos damos para além de matar a fome.

Afinal, assim que nascemos, ao primeiro sinal de desconforto e choro, recebemos o leite para suprir a fome. Também o recebemos para embalar o sono ou aliviar a cólica, dentre outros incômodos tão difíceis de identificar nos primeiros meses de vida.

Conforme crescemos, seguimos recebendo alimentos para saciar a fome e para nos reconfortar.

Certa vez, presenciei uma criança cair no chão da calçada, em frente à escola, e ralar ligeiramente os joelhos. Ela chorava muito e a mãe tentou confortá-la, mas ela não parava de chorar. A mãe, então, achou uma solução que conhecemos muito bem: “vamos tomar um sorvete bem gostoso?”. Na hora, a criança levantou e esqueceu o machucado no joelho. Parece mágica, certo?

Esse caso do sorvete que faz esquecer a dor é só umas das muitas situações em que o alimento é utilizado como conforto. Mas também vemos a comida ser utilizada como recompensa, o que pode se tornar problemático.

Quem nunca ouviu ou mesmo falou algo como “se comer toda a comida, você ganha chocolate”? Ou “se você raspar o prato, ganha sobremesa”?

Essas recompensas alimentares costumam ser oferecidas a crianças em outras situações além da mesa. Há quem prometa à criança uma guloseima em troca da lição de casa feita ou da cama arrumada, por exemplo.

Ganha um doce quem…(será que precisa mesmo de recompensa?)

Em geral, esses alimentos utilizados como recompensas são altamente palatáveis, por serem ricos em açúcar. Além da doçura, essas guloseimas costumam conter gorduras, conservantes, aromatizantes, corantes, dentre outros componentes que podem ser prejudiciais à saúde. Em se tratando da infância, é ainda pior, porque essa é uma fase de crescimento e desenvolvimento do corpo, além da formação do paladar. O consumo excessivo de alimentos muito doces ou industrializados é prejudicial.

Pensando no resultado imediato, pode parecer que essas recompensas funcionam. Afinal, no esforço para ganhar o doce, a criança acaba fazendo o que pedimos. Ela experimenta um alimento novo ou arruma a cama. Mas será que é uma estratégia interessante a longo prazo?

Recompensa em excesso pode ser prejudicial

É comum receber no consultório crianças que comiam legumes, verduras ou frutas, e por algum motivo, seja fase mais seletiva ou por qualquer outra questão, de repente passou a recusar determinados alimentos. Ao chantagear a criança prometendo a recompensa por comer o alimento recusado, a criança passa a entender que comer verduras, legumes ou frutas é uma obrigação. Assim, não vê prazer em comê-los e muitas vezes passa a sentir mais aversão ao alimento.

Quando a criança vê obrigação no alimento recusado, a hora da refeição muitas vezes passa a ser uma tortura.

Existem estudos científicos que mostram a relação da expressão facial de quem está alimentando a criança com a recusa alimentar. Ou seja: quanto maior a expectativa do cuidador para que a criança coma, maior a recusa. Além disso, temos estudos relacionando sobrepeso com o hábito de recompensar as crianças.

Existem também pesquisas que analisaram se o uso de recompensas com alimentos altamente palatáveis (como os doces) aumentaria o consumo de frutas, legumes e verduras. Observou-se que, além de não aumentar o consumo dos alimentos-alvo (frutas, legumes e verduras), houve diminuição desse consumo, e aumento da preferência pelos alimentos tidos como prêmio.

A alimentação saudável, que poderia ser vivenciada com momentos de prazer, acaba se transformando em ansiedade, podendo levar a neofobias alimentares e até mesmo a quadros de compulsão.

A bola de neve da recompensa alimentar

Vivemos uma transição nutricional. Antigamente, a maior preocupação das famílias era a desnutrição, e ainda temos enraizada a necessidade de ver a criança comer a qualquer custo. Por isso, é frequente a chantagem, a recompensa alimentar e outras estratégias para fazer a criança querer comer.

Mas esse caminho, apesar de muitas vezes ter o problema resolvido momentaneamente (a criança come), acaba criando uma bola de neve. A criança vai perdendo o prazer em fazer refeições com alimentos apropriados, desejando cada vez mais os alimentos tido como objetos de desejo — recompensas, no geral, altamente palatáveis.

O que você come quando comemora?

Já parou para pensar que a criança presencia a maioria das formas de celebrar com alimentos tido como “não saudáveis”? Por exemplo: no final de semana, vamos passear e comer hambúrguer com batatas fritas! Tivemos uma boa notícia e celebraremos pedindo uma pizza!

Crescemos em um ambiente que nos ensina a comer esses alimentos para celebrar. E quando a criança se depara com um prato com brócolis é um “Deus nos acuda”. Esse cenário faz parte da construção das preferências, e é importante observarmos a frequência com que fazemos isso em casa.

Como incentivar sem uma recompensa alimentar?

Mas, nutri, como eu vou incentivar meu filho a experimentar e aceitar novos alimentos sem oferecer nada em troca?

A preferência alimentar do seu filho é uma característica pessoal que é altamente influenciada pelos pais e cuidadores, através do seu comportamento e atitudes em relação à comida. Por isso, é muito importante que a família seja o maior incentivo no dia a dia da criança.

Algumas estratégias:

  • Fazer as refeições junto e comer o mesmo que foi ofertado
  • Levar a criança no mercado ou na feira para que ela amplie o contato com alimentos
  • Envolvê-la no preparo das refeições
  • Estimular o paladar, oferecendo o alimento mais de uma vez em diferentes formas de preparo

Também é fundamental entender que em algumas situações a criança pode estar sem fome ou indisposta para comer naquele momento. E tomar cuidado com a recompensa por bom comportamento: “Você se comportou muito bem hoje, vai ganhar um sorvete!"

Às vezes, quando queremos parabenizar nossos filhos, damos a eles um alimento que ele gosta e que não faz parte da rotina. Afinal, comida é afeto, é carinho e está sempre presente nos momentos de comemoração, mas isso não pode ser desculpa para transformá-la em moeda de troca para o bom comportamento do seu filho, principalmente quando estamos falando de alimentos que não fazem bem à saúde.

Assim, a criança sempre vai associar o bom comportamento com uma recompensa e não como um ato que devia ser natural. E recompensar o seu filho através da alimentação pode levá-lo a comer demais mesmo quando não está com fome, mascarando as sensações de fome e de saciedade. Além de aumentar as chances de a criança descontar suas emoções na comida.

Incentivo é tudo de bom!

É claro que aqui eu falo sobre excessos dessas atitudes. Quem nunca recebeu ou ofereceu um doce por algo positivo que se tenha feito? Alimentação também é carinho e afeto. O ponto importante é ter consciência e saber dosar essas ações para que não se tornem uma rotina prejudicial.

Incentivar bons comportamentos através de carinho e amor. Temos muitas formas de celebrar nossas conquistas: abraços, frases de incentivo, passeios, assistir filmes, dançar, cantar, criar novos rituais familiares...

São muitas possibilidades e opções —inclusive, deixar a criança decidir o que ela mais gosta de fazer, pedir a ajuda dela para pensar uma forma de celebrar, pode nos surpreender com novas e gostosas possibilidades.

Deixo aqui então um convite para encontrar novas formas de recompensar e de celebrar, e com essas ações demonstrar às nossas crianças o quanto são amadas.

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